A corrupção tem de acabar. Político
bom é político preso. Roubou, tem de pagar. Vamos prender todos eles. Vamos
tirar o PT, o PSDB, quem for corrupto. Fora corrupção. Fora PT... Em tempos de
corrupção no meio de tanta vida atribulada, corrida, na qual matamos um leão
por turno, são falas iguais a essas que nos espreitam como a um predador vigia
sua presa.
E, com essa vida materialista
nos pressionando o tempo todo, não sobra um segundo que seja para pensarmos em
nós, em nossos atos, em nosso comportamento como seres humanos. Não sobra um
suspiro que seja para pensarmos no que estamos fazendo para mudar o mundo, para
deixá-lo com um legado aproveitável por nossos netos e sobrinhos.
No entanto, o filme “Jogo do
dinheiro” (curiosamente chamado no original de “Money monster”), estrelado por
George Clooney e Julia Roberts, com direção assinada por Judie Foster (sim, a
atriz de “O silêncio dos inocentes” e “Nell”) nos coloca diante de um tema
extremamente discutido atualmente: a corrupção, principalmente aquela que
envolve o dinheiro em altas quantidades. Contudo, vou além e digo que a
película trata sobre o ser humano e de como a corrupção e nossos atos egoístas causam
transtornos irreparáveis na vida de um indivíduo, levando-o até a morte. E,
claro, sem nos esquecer, por meio do título, de que o dinheiro é o grande
produtor de monstros sociais.
A história gira em torno dos
personagens Kyle Budwell (Jack O’Connell) e Lee Gates (George Clooney), este o
âncora de um programa televisivo com dicas de investimentos na bolsa de
valores. Kyle, após receber uma herança pela morte de sua mãe e acreditando nos
apontamentos do talkshow de Gates, aposta todo o montante recebido numa empresa
(IBIS Corporation) que, após um erro de algoritmo, perde U$$ 800 milhões de
dólares. Querendo se vingar de Lee pelo fracasso, o entregador entra no estúdio
armado e promete acabar com a vida de todo mundo se não for lhe dada uma
explicação sobre o sumiço do dinheiro. Contudo, o que as pessoas não sabiam é
que esse sumiço não foi um erro de algoritmo, e sim algo bem maior do que se
imagina.
Ao descobrir que o presidente da
IBIS, Walt Camby (Dominic West), mentiu para sua equipe, o personagem de
Clooney começa a se interessar pela história de Kyle e chega até a ajudá-lo,
mas em vão. No entanto, conforme as informações vão brotando e sendo
descobertas, Gates e sua diretora do programa, Patty Fenn (interpretada por
Julia Roberts) levam ao público o poderoso esquema de corrupção armado por
Camby, que desperdiçou todos os investimentos dos acionistas, por conta de
interesses próprios.
O longa faz em seus 98 minutos
uma crítica ácida aos comportamentos humanos. Há os que não se importam com o
sujeito que perdeu tudo na busca por um sonho de poder ganhar mais dinheiro
para dar uma vida melhor a sua namorada e ao filho que está a caminho. Também aparecem
as pessoas que não têm sensibilidade nenhuma, compaixão nenhuma e espírito
solidário nenhum ao não ajudarem Gates a fazer as ações da IBIS crescerem, para
salvar a sua pele. Além disso, há os inúmeros “memes” feitos para o presidente da
empresa, Walt Camby, que cai desajeitado por conta de um susto que leva de Kyle.
Tudo isso demonstra o comportamento do ser humano que hoje não se importa com o
próximo, vivendo num mundo onde tudo é motivo de espetáculo, o que é provado
pela quantidade de espectadores ligados na televisão acompanhando o drama do
âncora do programa, ou seja, vivemos numa sociedade do espetáculo, em que a
vida alheia, ainda que em perigo, é mais interessante do que qualquer outra
ação.
Ademais, há a presença da
crítica à mídia, que manipula a massa, fato comprovado pela imagem que a mídia
vai criando sobre o suposto vilão, Kyle, que, na verdade, é o anti-herói, pois
ele é apenas um cara comum, trabalhador, que perdeu tudo e quer saber o motivo
de ter sido enganado, mas que vai se transformando numa espécie de herói, uma
vez causa uma comoção nos personagens, transformando-os. Somente no povo não
causam comoção nenhuma, pois, após os eventos transmitidos, todos simplesmente
saem da frente da televisão e retornam à vida normal, como se nada tivesse
acontecido nada. Nos deparamos também com a transformação no personagem de
Clooney, que muda sua afeição e parece atingir a redenção pelo o ocorrido com o
Kyle e também pelo desapontamento com o mercado financeiro, ou, melhor, com as
descobertas que fez sobre os seres humanos e seus comportamentos e como tem
colaborado com isso. É uma espécie de mistura de realismo com romantismo,
causando uma catarse que tira o telespectador do lugar, promovendo uma reflexão
profunda acerca do comportamento humano na contemporaneidade, sobre quais são
nossas prioridades, principalmente quando deixamos outras necessidades de lado
para nos agarrar o ganho capital, nos transformando em monstros sociais que
criam outros monstros à solta por aí (fazendo alusão o nome do filme, “Money
monster”).
Por fim, uma das falas que
resume o filme é a do vilão, o presidente da companhia, Walt Camby, quando
afirma a Kyle que ele só estava ali reivindicando seu direito porque ele perdeu
algo, ou seja, se ele tivesse ganhado alguma coisa, mesmo se outros tivessem
perdido, ele não estaria ali, não se importaria. Isso denota bem a situação que
vivemos no Brasil hoje, principalmente quanto à corrupção: enquanto eu levo
vantagem com a corrupção, por menor que seja, está tudo bem; porém, se eu
começo a ser prejudicado, não me interessa se outro está ganhando, eu quero
meus direitos. E há mais uma cena, a do cameraman colocando a sua câmera no
chão, de frente para o público, criando uma metáfora clara de que tanto a mídia
quanto os meios artísticos, como o cinema, estão de olho, estão olhando,
filmando as pessoas e, principalmente, o que se pode encontrar de errado no mundo
para denunciar.
Dessa forma, percebe-se
claramente com o longa-metragem uma crítica à individualidade das pessoas, à
falta de bom senso, de compaixão, de solidariedade ao outro, pois só procuramos
nossos direitos porque nos sentimos lesados, ainda que outros estejam se dando
bem, além de um recado bem claro de que as câmeras e os meios de comunicação
estão aí para prestarem serviço à comunidade.
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